segunda-feira, 30 de março de 2009

SIM OU NÃO

(por Martha Medeiros


Assisti no DVD ao filme O Escafandro e a Borboleta, baseado na história verídica do francês Jean-Dominique Bauby, editor da revista Elle, que aos 42 anos sofreu um acidente vascular cerebral e ficou com o corpo inteiro paralisado, preso a uma cadeira de rodas num hospital. Com o cérebro funcionando perfeitamente, mas sem poder falar, sua única alternativa de comunicação era usar o olho esquerdo (o direito foi costurado para evitar uma infecção) e então ele aprendeu um método de piscadas que fez com que conseguisse, num esforço de persistência impressionante, ditar um livro contando seu drama.

Mas quero retroceder um pouco nessa história. No começo da doença, o método de piscagem funcionava para algo bem mais prosaico: apenas responder sim ou não às perguntas que lhe faziam. Sim, uma piscada. Não, duas piscadas.

Parece simples, mas, se nos colocarmos no lugar dele, é enlouquecedor, porque o sim e o não jamais bastam como resposta. Ao menos não para mentes inquietas e ansiosas como a minha e, creio, a sua também.

Você está confortável?

Não, mas tampouco preciso de uma almofada, quero voltar pra cama.

Você quer assistir tevê?

Sim, mas mude de canal.

Até aqui, nada de muito trágico resulta da incompletude das respostas, da falta de um “desde que”, mas e se fossem outras as perguntas?

Você quer que seus filhos venham te visitar, sim ou não?

Duas piscadas. Não. Uma resposta como essa sugere um cara frio, que já não se importa com nada, porém o que ele talvez quisesse responder é: “Não sei se meu coração suportará, não tenho certeza de que aguentarei estar tão perto deles sem tocá-los, sem beijá-los, e além disso, estou completamente torto, eles podem se assustar com a minha desfiguração. Deixe eu pensar no assunto e me pergunte isso outra vez semana que vem”.

Fiquei me imaginando nessa situação desesperante de ter que resumir minhas vontades e ânsias com apenas um sim ou um não, quando na verdade essas duas palavras nem sempre são antagônicas e muito menos definitivas, elas podem coabitar o mesmo desejo – quem nunca vivenciou um impasse?

Amar alguém e ao mesmo tempo sofrer a seu lado, desejar fazer uma viagem e ao mesmo tempo ter medo, encaminhar-se para um divórcio e ao mesmo tempo temer a solidão, precisar da visita de uma amiga, mas não hoje. No entanto, só lhe resta ser sucinta na resposta: quer que eu vá te ver, sim ou não?

Se me dessem como alternativa apenas essas duas respostas miúdas, sem a chance de desenvolvê-las, de apresentar alternativas e de deixar claro que posso mudar de ideia, acho que eu nunca teria atendidas as minhas vontades, porque minhas vontades vêm com explicações sobre o modo de usar.

Meus sins e nãos jamais conseguiriam, sozinhos, arcar com as consequências de seu significado.

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