sábado, 25 de outubro de 2008

OS FLAMBOYANTES

A manhã estava linda: céu azul, ventinho fresco.
Infelizmente, muitas obrigações me aguardavam.
Coisas que eu tinha de fazer.
Aí, lembrei-me do menino-filósofo chamado Nietzsche que dizia que ficar em casa estudando, quando tudo é lindo lá fora, é uma evidência de estupidez.
Mandei as obrigações às favas e fui caminhar na lagoa do Taquaral.

Bem, não fui mesmo caminhar.
Meu desejo não era médico, caminhar para combater o colesterol.
Caminhar, para mim, é uma desculpa para ver, para cheirar, para ouvir...
Caminho para levar meus sentidos a dar um passeio.
Tanta coisa: os patos, os gansos, os eucaliptos, as libélulas, a brisa acarinhando a pele — os pensamentos esquecidos dos deveres.
Sem pensar, porque, como disse Caeiro, "pensar é estar doente dos olhos".
Aí, quando já me preparava para ir embora, já no carro, vejo um amigo.
Paramos.Papeamos. Ele, com uma máquina fotográfica.
Andava por lá, fotografando.
Não tenho autorização para dizer o nome dele.
Vou chamá-lo de Romeu, aquele que amava a Julieta.
Me confidenciou: "Vou fazer uma surpresa para a Julieta.
Ela adora os flamboyants. E eles estão maravilhosos.
Vou fazer um álbum de fotografias de flamboyants para ela...
Você não quer vir até a nossa casa para tomar um cafezinho?"

Fui. Mas ele me advertiu: "Não diga nada para ela. É surpresa..."
Pois a Julieta — aquela do Romeu — me trouxe uma pipa de presente.
Vou empinar a pipa em algum gramado da Unicamp.
E aí ela nos contou da surpresa que lhe fizera o Romeu.
Fotografias de flamboyants vermelhos — que coisa mais romântica!
Árvores em chamas, incendiadas!
Cada apaixonado é um flamboyant vermelho!
E nos contou das coisas que o Romeu tivera que fazer para que ela não descobrisse o que ele estava preparando.

Mas o mais bonito foi o que ele lhe disse, na entrega do presente.
Não sei se foi isso mesmo que ele disse. Sei que foi mais ou menos assim: "Sabe, Julieta, aquela história de ter um ano apenas a mais para viver...
Pensei que você gostava de flamboyants e que você ficaria feliz com um álbum de flamboyants.
E concluí que, se eu tiver um ano apenas a mais para viver, o que quero é fazer as coisas que farão você feliz..."

Um ano apenas a mais para viver: aí os sentimentos se tornam puros.
As palavras que devem ser ditas, devem ser ditas agora.
Os atos que devem ser feitos, devem ser feitos agora. Quem acha que vai viver muito tempo fica deixando tudo para depois.
A vida ainda não começou. Vai começar depois da construção da casa, depois da educação dos filhos, depois da segurança financeira, depois da aposentadoria...

As flores dos flamboyants, dentro de poucos dias, terão caído. Assim é a vida. É preciso viver enquanto a chama do amor está queimando...
RUBEM ALVES


Eu também tirei fotos para minha amada...
Depois de 47 anos fui reparar, como são lindas as flores do flamboyants.

Nenhum comentário:

ALMA DE EDUCADOR

VISITE MEU BLOG "ALMA DE EDUCADOR"